Resenha: Seconds (Graphic Novel)
Bryan Lee
O’Malley apareceu em meu radar quando o filme Scott Pilgrim Contra o Mundo estreou em 2010. Ainda que tenha sido,
do ponto de vista mercadolĂłgico, um fracasso e apesar do roteiro do mesmo nĂŁo
ser escrito diretamente por O’Malley, o longa foi baseado na fantástica sĂ©rie
de graphic novels dele. E a direção de Edgar
Wright felizmente foi o mais fiel possĂvel Ă obra original.
Apesar de essa resenha nĂŁo ser sobre Scott
Pilgrim, foi através dele que me interessei pela forma criativa, engraçada e
humana pela qual Bryan Lee O’Malley conta suas narrativas. E foi assim que
tomei conhecimento de Seconds.
Seconds Ă© a terceira histĂłria de O’Malley em
formato graphic novel e foi lançada em 2014 com a grande expectativa de ser o
próximo trabalho do autor após a série Scott Pilgrim. Sua premissa é bem
simples:
1. Escreva seu erro
2. Ingira um cogumelo
3. Vá dormir
4. Acorde de uma
maneira nova
Ok, talvez nĂŁo tĂŁo simples assim. Em Seconds
somos apresentados ao dia a dia de Katie. Ela tem tudo mais ou menos resolvido
na vida. É uma talentosa chefe de cozinha, uma das fundadoras de um famoso
restaurante (Seconds), e com planos para abrir um ainda melhor. E entĂŁo, de uma
hora para outra, a reforma do novo restaurante vai de mal a pior, seu
ex-namorado volta para cidade, e uma colega de trabalho se fere em um acidente.
E simples assim, a vida de Katie vai de “bem legal” para “nem tanto”. O que ela
precisa Ă© de uma segunda chance, dar um jeito para que tudo volte ao normal... Felizmente,
Ă© exatamente isso que ela consegue! Uma garota misteriosa aparece em seus
sonhos com instruções bem fácies para que tudo seja refeito: “1. Escreva seu erro; 2. Ingira um cogumelo;
3. Vá dormir; 4. Acorde de uma maneira nova.”
Com a ajuda de alguns cogumelos mágicos
todos os problemas de Katie desaparecem... E muitos outros surgem.
Ler Seconds Ă© uma experiĂŞncia muito
divertida. Katie tem “o pĂ©ssimo hábito de conversar sozinha” e por isso vive
discutindo com o narrador da histĂłria, principalmente quando ele narra como
Katie está realmente sentindo, queira ela admitir ou não. A história é
temperada com muito bom humor e os incrĂveis desafios comuns de quem tem uma
vida normal, apesar dos elementos fantasiosos.
O começo um pouco lento da graphic é
justificado com a familiaridade que o leitor ganha com os principais
personagens e seu ambiente, apesar de que, mesmo com todo o esse espaço, o
autor ainda deixe (talvez propositalmente) algumas perguntas sem respostas. Katie
aos poucos percebe que a vida perfeita e sem erros elaborada por ela Ă© (a
margem da minha interpretação) uma forma de negligenciar seu futuro. Ela
aprende “as consequĂŞncias nĂŁo intencionais das melhores intenções”. O conceito
dos espĂritos domĂ©sticos, as entidades que cuidam do lar, Ă© bem inserido e
serve tanto para adicionar um humor nonsense (na forma de Lis, os espĂrito
domestico do restaurante Seconds) quanto para mover a trama. A arte Ă© bem
cartunêsca e ao contrario das obras anteriores do autor está toda colorizada.
O’Mally Ă© criativo e sabe brincar com as caracterĂsticas de um quadrinho.
Uma das melhores qualidades que encontrei
nas histĂłrias de Bryan Lee O’Malley Ă© a facilidade com que podemos nos
identificar com seus personagens, apesar de todas as circunstancias
hilariamente absurdas. Scott era apenas um jovem no começo da vida adulta, sem
ideia do que fazer com o futuro e com um passado (dele e de outros) para dar-lhe
socos na cara (às vezes literalmente). Katie é uma personagem que já está no
meio disso tudo e apesar de ser bem mais experiente que Scott, apesar de ter 29
anos, e apesar dela saber o que quer, o futuro ainda parece assustador. NĂŁo
apenas isso, além da própria protagonista, todos os outros personagens têm
qualidades e traços bem reais e humanos, eles conseguem funcionar como os
arquétipos clássicos e ao mesmo tempo poderiam ser qualquer pessoa que
conhecemos.
A histĂłria se fecha em apenas um volume, entĂŁo
nada de longos anos esperando continuações para aqueles que não querem se
comprometer.
Seconds tem todos os temperos de uma boa
narrativa. Tem uma protagonista carismática, um amiga que manja dos paranauê,
um ex-namorado irritante, alguns adolescentes aleatórios, ótimas ilustrações,
um restaurante, outro restaurante em construção, uma receita de lombo de coelho
(sĂ©rio!), espĂritos domĂ©sticos, cogumelos mágicos, um autor sem medo, easter
eggs e uma lição de vida sobre segundas chances que dá base à história contada,
por todos esses motivos Seconds Ă© sem dĂşvida sugerida a todos que souberem
apreciar. Mas por favor, não esqueçam: pão engorda.
Por: Erick Alexandrino, colaborador
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